terça-feira, outubro 04, 2005


"E o luto sem saída
da hora não vivida
é bem pior pra o coração
que a despedida"
(Aldir Blanc/Guinga)


Acordou com a falta, e uma falta sem conserto, dor sem bálsamo, doença sem cura.
Chegava, às vezes, a pensar que tudo era imaginação sua, que nem sentia mesmo nada daquilo. Talvez, gostasse de sofrer. Poderia ser masoquista, sofrer de algum distúrbio psíquico, afetivo, moral, que a fizesse se apegar à irrealidade daquele sentimento.
Sabia que amor era coisa rara, era uma aflição perceber que tanto amor se desperdiçava pela vida.
O que havia restado de tanto sentir? O livro que ele havia escrito, sem a sua permissão.
"Tanto Amor, pra virar literatura..." pensava. Muitos haviam lido e leriam ainda a história deles dois, história triste por demais, linda e triste, pensariam. Mal saberiam da vertigem em vida deles, das neblinas, do sufoco. Mal saberiam do choro, da raiva, dos desejos.
Se não se houvesse sabido correspondida, tudo teria sido mais fácil. Teria doído, mas muito mais simples era esquecer o desamor do outro. Mas aquilo era por demais terrível: sabia que ele também a amava, muito embora nunca palavra tenha sido dita. Era tão visível quanto ridícula a intenção dele de negar o seu sentir.
Essa era a amarra que a prendia irremediavelmente. Amarra sem nó ou cadeado, laçada imaginária em torno de seus pés, olhos e garganta. Prisioneira livre que era, sem chaves ou algemas, sabia que não fugiria nunca daquilo enquanto lhe fosse permitido ser.