Acordou tarde.
Fora, uma chuva fina deixava o mundo nublado e preguiçoso.
Se ficasse naquele quarto, a melancolia seria capaz de o enlouquecer.
Levantou-se, lavou o rosto e viu-se de soslaio no espelho manchado; tinha olheiras profundas, embora tivesse acabado de acordar, a barba clara, rala e macia se deixava por fazer há dias. Parecia extremamente cansado.
Pedro era um homem bonito. Rosto branco, cabelos finos, feições de menino. Menino perdido. Seus olhos eram doces mas exibiam uma certa inquietude desconcertante. Mesmo com os cabelos desgrenhados e os poucos pêlos que lhe faziam as vezes de barba, era um homem bonito.
Vestiu-se, pôs um velho casado marrom, ergueu a gola e saiu pela chuva fria, direto ao “rendez-vouz” de madame Margot.
Carlos não se continha ao ouví-lo chamar assim a aquele puteiro escuro onde se encontravam toda semana. “Esses poetas” dizia, entre risos, seios e doses de whiski barato.
Para Pedro, aquele era o último laço de requinte a que se podia prender. Adentrava o ambiente e, incontinente, após algumas doses de conhaque, se punha a recitar Baudelaire para suas “cortesãs”: “Tu mettrais l’univers entier dans ta ruelle / Femme impure! Le’ennui rend ton ame cruelle”
Pensava ter nascido no século errado; via-se nos cabarés de Paris, tomando absinto e fumando ópio entre atrizes cabelos cílios de azeviche haxixe pernas e poemas.