domingo, dezembro 26, 2004

A Festa

O fato é que havia Amor. Não do jeito que deveria haver, mas além. Estiveram desde sempre juntos e agora surgia aquele sentimento incoveniente entre eles. Não sabiam, definitivamente, o que fazer.

E, desde que fora sabido, não conseguiam resistir ao apelo de estarem perto um do outro para que pudessem sofrer.

Poderiam muito bem, e é o que deveriam, se afastar a título de qualquer motivo, afinal, ninguém estranharia deveras , já que a proximidade entre eles nunca houvera realmente se dado em público.

Mas, enfim, estavam próximos novamente. E sofriam daquele Amor de hora atrasada.

A ela, cabia a constatação de vê-lo bêbado pela segunda vez, depois de tantos anos, por sua culpa, assim como da primeira. A ele, recaía como peso extra o fato de que ela tenha tocado no assunto primeiro. Nunca deveria ter verbalizado o fantasma de dentre eles.

Esperaram que a festa tivesse acabado para que pudessem se torturar com mais veemência e maior imprudência. Ela desconfiava que houvessem burburinhos entre a família. Não poderiam ser tão burros assim. Ele possuia o aval da moralidade; acima de qualquer suspeita. Seria um escândalo e um susto. A hora era inadequada. Estavam se arriscando à toa. E por nada.

Depois de terem a garantia de estarem embriagados, ficaram trocando metáforas até que o dia houvesse raiado de há muito. Nunca eram diretos, tentando disfarçar o que sentiam de si mesmos. As alegorias das quais se valiam não afirmavam nada um para o outro. Ou tudo. Podiam significar ou isto ou aquilo. E assim deveria ser, embora tudo estivesse muito às claras. Haveriam de se negar, sem usar o não, até o fim.

Ele se deitou no chão e ficou olhando o céu, enunciando imagens sem sentido. Ela, dada ao sofrer agônico, ficou dando voltas e mais voltas ao redor dele. Vez ou outra dizia alguma coisa que poderia significar qualquer coisa.
Sem a família, talvez tivessem até... O desespero da presença ausente entre eles era claustrofóbica. Seus ouvidos zuniam.

Ela chegou a desejar o beijo.

Ele, só partiu quando ela o deixou.

Nunca se tocaram.